segunda-feira, 6 de abril de 2009

Do inferno ao céu em quatro anos

Grêmio: o ex-presidente Paulo Odone conta em entrevista exclusiva como foi sair do passado da Série B para o presente da Libertadores e sobre o futuro com a construção da Arena Grêmio


Em uma iniciativa do Consulado Regional de Passo Fundo, comandado pelo cônsul Roberto Toson, o agora ex-presidente, Paulo Odone esteve na cidade no dia 16 de agosto ano para ouvir os gremistas desta região do estado. Muito solícito, Odone foi ovacionado pela Geral passo-fundense (a torcida local) e não teve muitas queixas. Depois de duas pancadas fortes (Copa do Brasil e Gauchão), como ele mesmo definiu, Odone colheu os frutos da convicção no trabalho do eterno contestado Celso Roth.

ON aproveitou para entrevistar o tricolor responsável pelo mandato em que o clube saiu do calvário da segunda divisão para uma gloriosa final de Libertadores e, naquela época, vivia a esperança do tri brasileiro, após o encerramento do primeiro turno nacional na liderança da competição. Confira.


O Nacional - Como resumir dois mandatos, nos quais se foi do inferno (Série B) ao céu (Libertadores)?
Paulo Odone - Bom, de início assumimos um clube praticamente falido. Esta é a verdade. Hoje conseguimos equacionar as dívidas, temos acordos de condomínio e quando vendemos um jogador vamos resolvendo isso. Mas nós tínhamos a convicção de voltar a olhar para o torcedor e imprimir o futebol de competição, de muita raça e alma, a tradição do Grêmio, que nunca teve grandes times tecnicamente, mas de muita pegada e imposição de respeito. Aí nos chamaram de copeiros. Foram duas coisas: demos solidariedade ao torcedor e ele tirou o Grêmio do buraco. Se você olhar esses meninos da Geral, são todos sócios e fazem questão de ter esse documento. Então hoje estamos com quase 50 mil contribuintes, o que nos permite ter um certo gás para pagar as dívidas e manter um time razoável, mas ainda com um custo muito inferior ao dos adversários próximos, que gastam de três a quatro vezes mais, o que corrobora aquilo que penso: que não se faz time comprando em prateleira, constrói-se. A equação das dívidas, o estímulo ao torcedor, a aposta nas categorias de base e não se afastar da convicção no futebol. Foi assim com os times do Mano, é assim com os times do Celso Roth. Isso deu certo no passado e está dando certo agora. O grande segredo é essa paixão tricolor.


ON - Essa convicção fez o clube manter um treinador tão criticado como Celso Roth?
PO - Com certeza. Celso não é um técnico que treina a mídia, a torcida, que diz coisas agradáveis. Nós até conversamos com ele, dissemos que hoje para trabalhar na profissão, além do time, tem que treinar a mídia, a torcida, no sentido de conversar, e o Celso, internamente, é uma pessoa afável, de diálogo. O que aconteceu é que um time como o Grêmio não pode levar aquelas porradas que levou em uma semana (Gauchão e da Copa do Brasil). Era preciso reagir. A questão ali era ter convicção ou não. A reação do torcida foi normal. Mas mantivemos a convicção e apostamos nele. Se for fazer pela onda do resultado imediato bom ou ruim, você não mantém técnico, não faz equipe, não bota faixa de campeão. Ainda não ganhamos nada, ninguém está de salto alto, todo mundo sabe que estamos começando a segunda etapa, que é do tamanho da primeira, assim como somos líderes hoje, podemos ser os últimos, se resolvermos deixar de lado o foco, a garra, a pegada.

ON - O Grêmio sempre foi copeiro, porque se saía melhor no mata-mata. A liderança do Brasileiro é uma prova de que o time está quebrando esse tabu de não se sair tão bem nos pontos corridos?
PO - O Grêmio é copeiro e as copas que o clube que ganhou até o título mundial eram no mano a mano. Inclusive chegando na Libertadores pela Copa do Brasil, que é no formato mata-mata. Mas o mais importante do Grêmio copeiro não é só a fórmula, mas a competitividade, a força, e antes da técnica, a arte, que nós não desprezamos. É bom ter um jogador assim que qualifica a equipe, caso do Tcheco, que pensa o jogo, sabe o que faz. Não dá pra dizer que ele é só força e velocidade, mas a equipe como um todo é isso. Nesse sentido ela é lutadora, é brigadora, é copeira. A interrogação é saber se conseguimos manter o espírito em um campeonato tão comprido como esse. É um desafio.


ON - A não convocação do Léo para as Olimpíadas complicou a natural negociação do jogador?
PO - Acho que Léo tem nome e futebol suficientes para, mesmo sem ter ido para as Olimpíadas - pela limitação que deram quando o Thiago Silva se machucou, o Lucas foi improvisado- , o Léo estaria lá certamente e as pessoas que intermediam sabem da circunstância. A questão que eu lamento é quando temos que vender um jogador, pois quando o vendemos, respiramos, porque o clube consegue ter gás para completar o ano tapando os furos do futebol. O Grêmio tem tido sorte ou virtude nas duas coisas: temos vendido e conseguido manter para terminar o campeonato, caso do Anderson que acabou sendo premiado pelo talento com aquele gol fantástico na Batalha dos Aflitos. Ele já estava vendido, jogando conosco, com muita moral e personalidade, um garoto de 17 anos. Claro que eu queria que ele estivesse jogando com o Lucas, o Carlos Eduardo. Mas eles nos deram gás para tirar o Grêmio do estado de falência. o dinheiro do Anderson nos fez sair da segunda divisão e depois o do Lucas para nos manter jogando. Isso comprovou que o investimento nas categorias de base não é mais um discurso de cartola, é uma necessidade. E a gente está assim, sempre que está revelando, alguém está pedindo passagem. Hoje estamos com cinco nos grupos da seleção. É caça-níquel, chego a temer os que não tem 18 anos e contrato longo, porque isso os expõe aos urubus de plantão. A compensação é que o Grêmio tornou-se hoje uma grife. Jogando no Grêmio, o menino sabe que vai se valorizar e ser bem vendido. E nós vamos ter que estar sempre olhando para baixo para ver quem está pedindo passagem. Léo se foi, mas estamos com dois zagueiros pedindo para entrar, o Heverton e o Wagner, sem falar no William Thiego. Isso dá um descanso e um respaldo de ficar sem medo de vender. Se ficou provado que se pode aproveitar, também é um mérito do Celso Roth. Treinador sempre tem um pouco de medo, cautela com os garotos. Mas você equilibra isso.


ON - A concretização da Arena será uma realização fora do mandato do presidente Odone?
PO - No final do ano completo quatro anos de mandato no Grêmio. Se eu conseguir entregar o time na Libertadores será a glória. Depois que conseguimos passar pela Batalha dos Aflitos e deixarmos equacionadas as dívidas do clube, o grosso está feito, risco não tem mais. Eu temia muito pelo futuro do Grêmio, na época foi o que me fez voltar para a direção. Nunca pensei que iria ser presidente, mas cumpri essa tarefa. Acho agora que o grande upgrade que falta para o Grêmio é ter seu estádio. Nos já tivemos a Era da Baixada, a era gloriosa do Olímpico, mas está tudo superado. Estádios como o nosso são muito onerosos e pouco funcionais. Um projeto como o da Arena, que quanto mais eu penso, mais eu vejo como é fantástico. O Grêmio vai poder inaugurá-lo na entrada de Porto Alegre, o que vai facilitar muito para o torcedor do interior, um estádio que não só vai gastar menos em manutenção como terá um complexo superavitário, que vai lhe dar auto-sustentação, e isso hoje é fundamental no plano internacional. Então eu alimentei esse sonho, essa fantasia, de me dedicar a isso no Grêmio ainda por três anos para entregar, junto com os companheiros e a torcida, o novo templo do Grêmio na cidade e no estado, porque realmente não haverá nada mais moderno.


Despedida


No salão nobre Patrono Fernando Kroeff, em reunião do conselho deliberativo, aconteceu a sessão que empossou o novo presidente na noite da última segunda-feira. Duda Kroeff, filho do patrono do clube, assumiu o comando para o biênio 2009/10.
A sessão extraordinária teve a abertura do presidente do conselho, Raul Régis de Freitas Lima. Logo depois, o ex-presidente Paulo Odone despediu-se do cargo, emocionado no discurso que, segundo ele, não foi pensado, mas "falado com o coração". Odone reiterou que ajudará o Grêmio no que for preciso: "Duda, pode contar conosco".

(Fotos: Paulo Roberto D'Agustini/ON e Divulgação/Grêmio)


Entrevista publicada na edição de O Nacional dos dias 27 e 28 de dezembro de 2008

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