"Este jogo estimula a esperança não apenas de se tornar um jogador melhor, mas de se tornar um ser humano melhor." A frase do presidente da Fifa Joseph Blatter sobre o futebol serve para ilustrar esta história e tantas outros deste esporte. O futebol, que já foi palco de manifestações racistas por todo mundo, também encontra demonstrações de amizade, igualdade e paixão. É isso que um grupo de ex-jogadores da pequena Passo Fundo ensina. Há 13 anos eles mantém a tradição da pelada de final de ano entre negros e brancos. Mas quem pensa que a cor da pele acirra a disputa engana-se. Ela representa apenas a diversidade entre amigos.
Em um encontro surgiu a idéia de, a cada final de ano, realizar um jogo festivo. "Pensamos em fazer um Gre-Nal, um gordo contra magro... Mas acabamos fazendo mesmo negros contra os brancos," explica um dos organizadores, o ex-jogador e hoje professor de futsal, Anderson Silva, o Adílio, junto com Toco. Desde 1995, esse já é o 14º jogo, pois em um ano houve duas partidas. "Existe uma hegemonia dos negros sobre os brancos nessa brincadeira. São cinco empates, oito vitórias dos negros e apenas uma vitória dos brancos," provoca o capitão do time negro.
A primeira fora
As mãos do ex-goleiro Jairo, que antes impediam o grande momento do futebol, hoje cuidadosamente preparam a salada para depois do jogo. Pela primeira vez fora do gol dos negros devido a uma cirurgia na coluna, Jairo estreou no comando da equipe. O ex-goleiro emociona-se ao lembrar da curta carreira. Depois de formando nas categorias de base de 14 de Julho, ele subiu para a primeira divisão com o Lajeadense. Passou ainda por Figueirense, Corumbaiense e Navaraiense, do Mato Grosso, e pendurou as luvas no extinto Dínamo, de Santa Rosa, aos 28 anos. "Passei em um concurso da Brigada Militar. Naquela época o futebol era difícil. Passou um tempo para eu assimilar a parada. Chego a me arrepiar todo," recorda.
Teimoso da bola
O ex-lateral direito Caio saiu da fornada de talentos do Passo Fundo do final da década de 1980 que tinha Casanova, Irineu e Marquinhos entre outros. Mas quis o destino pregar uma peça no ex-jogador que, aos 27 anos, após disputar o Gauchão pelo rival Gaúcho, teve que abandonar precocemente os gramados. Caio descobriu um descompasso no coração que fez com que tivesse que implantar um marcapasso. Hoje, aos 42 anos e dois aparelhos depois, ele é considerado pelos amigos um teimoso. "Nunca mais poderia jogar. Mas seis meses depois a vontade foi maior. Ainda participei de campeonatos amadores por várias cidades e hoje jogo de três a quatro partidas por semana", conta Caio. O hoje cabeça-de-área do time branco está no terceiro marcapasso, que por causa do futebol dura de quatro a cinco anos. "Quando jogo, ele desliga e quando repouso, ele liga, mas levo uma vida normal, jogando claro."
Igualdade no placar
Em um jogo como esse o placar foi o menos importante, certo? Errado. Amigos à parte, assim como aqueles que nunca foram profissionais, todo mundo queria vencer. E principalmente os brancos que queriam a revanche depois da derrota por 8 a 6 no ano passado. Sem perder a categoria, apesar do pouco preparo, a partida de futebol sete em uma propriedade particular, foi bastante disputada. Depois de abrirem 4 a 1, os brancos assistiram os negros virarem o placar. Mas no final a equipe branca empatou, garantindo o sexto empate da história do confronto.
A confraternização tem como apoiadores Lago Pão, Krep's, Anglasa Ltda, J.A Confecções, Sulyvest Uniformes, Guaraplan Consórcios, MD Centro Hípico e Haras.
Números da festa
Cebola - 5 kg
Alface - 6 un
Tomate - 5 kg
Maionese - 11 kg
Refrigerante - 20 l
Cerveja - 216 l
Ovelha - 15 kg
Gado - 25 kg
Galeto - 15 kg
Carvão - 24 kg
Convidados - 65
Negros 5 x 5 Brancos
Negros
Corvo (goleiro)
Adílio
André Carijó
Deco
Dudu
Duia
Juarez
Luciano
Mano
Nelson
Petrônio
Rafael
Rodrigo Brigada
Brancos
Zolet (goleiro)
Adair
Branco
Caio
Dian
Didoné
Elcio
Lagranha
Marquinhos
Teco
Toco
(Fotos: Paulo Roberto D'Agustini/ON)
Reportagem publicada na edição de O Nacional do dia 29 de dezembro de 2008
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