Carros antigos: se você é daqueles que já de longe identificava por nome, sobrenome e apelido qualquer automóvel, enxergando apenas uma ponta da traseira, um farol ou até mesmo um friso, agora vai poder reviver essa história de muitos outros brasileiros apaixonados por carros
Ao chegar, o local aparentemente poderia ser qualquer oficina, qualquer depósito. Mas não é. Na verdade é um portal, uma passagem no tempo. Um tempo em que o que hoje se chama customizar era feito com talvez muito mais ousadia. Um tempo em que o surgimento da mecanização da sociedade tornou-se uma ferramenta para criar, inventar, pensar. Um tempo nostálgico, mais para aqueles que viveram e menos para aqueles que gostariam de ter vivido. Um tempo que não volta, mas que fica registrado na memória e no chassi dos automóveis antigos.
Os irmãos Azambuja, Róberson e Rogério, são desses brasileiros apaixonados por carros. Foram crianças em um tempo em que nem todo mundo tinha um na garagem. Era artigo de luxo. Mais do que admirar, eles queriam conhecer cada detalhe, cada peça, cada história. "Quando tinha nove ou dez anos, além de estudar, minha vida eram os carros. Era uma febre, um fascínio que crescia a cada dia, e ainda cresce", conta Róberson.
Há cerca de 15 anos o que hoje é para ele quase uma profissão, começou como brincadeira. "Eu queria comprar um segundo carro. Então encontrei um Fusca 1966 super original. Resolvi comprar. Logo depois encontrei um Ford 1931, os dois super inteiros. Não resisti. Então resolvi abraçar a causa (risos)." Uma volta. Foi o que bastou para o irmão cair na mesma tentação. "Um dia o Rogério deu uma volta no Fusca e gostou da idéia. Começamos a procurar um Simca para ele. Achamos, e depois foi uma seqüência." Não demorou muito para que os correligionários se encontrassem. "Como a gente encontrou uma parceria, fundamos o Veteran Car Club de Passo Fundo, com o Paulo Trevisan, com a família Graeff, César Romero, entre outros. Hoje temos mais de 60 sócios."
Uma aula de história
A indústria automobilística no Brasil acompanhou a trajetória da nossa jovem democracia. Foi protagonista e coadjuvante, mas nunca saiu de cena. Final da década de 50: começam a ser produzidos automóveis no Brasil. Final da década de 70: as importações de carros são proibidas. Os dois momentos pontuam nossa viagem no tempo.
Para ter um carro exclusivo, diferenciado, muitos "malucos", como são carinhosamente chamados, começaram a inventar. Surgiram então as fabriquetas. "São os chamados fora de série, uma história muito interessante que poucos países têm, uma coisa que surgiu forte no Brasil", explica Róberson. "Naquela época a Quatro Rodas, a cada mês, publicava uma reportagem com um fora série novo. Nós éramos meninos então ficávamos na expectativa, esperando cada nova edição. Hoje aqueles carros praticamente sumiram."
Democrata
O carro foi um sucesso de venda. E de engano. Foram vendidos mais de 87 mil e só fabricados apenas três. "Cada pessoa teria direito a um carro se comprasse no mínimo X ações. Mais de 87 mil pessoas fizeram negócio, mas não receberam o carro. "Um caminhão viajava pelo país com um carro, o ‘laranja de amostra’, que por vezes descia e dava algumas voltas. Por isso ele é muito raro. Esse modelo é único. O motor é original e tem a inscrição IBAP - Indústria Brasileira de Automóveis Presidente." Depois de 20 anos, quando o processo de falência da empresa encerrou, o lote foi a leilão. O carro projetado em 1964 lembra o Mustang. "Era um sonho e muita gente comprou. Na época existia muito folclore em relação a isso", conta Azambuja.
Limusine Willys
Fabricado em 1968 é o único limusine de série fabricado no Brasil. Foram construídos apenas 26 carros que serviram todos à Presidência da República, governadores e ministérios. "Esse é o número 13. O último executivo utilizado oficialmente pela Presidência na posse do presidente Fernando Collor. Depois o carro foi a leilão". O limo foi o primeiro nacional a ter ar-condicionado. "O ar é só para os passageiros, não para o motorista, separado por um vidro com acionamento elétrico", observa Azambuja. "Muitos desses carros estão fora do Brasil. Sabemos que tem um no museu do automóvel do Japão."
Foras de série autorizados
Da proibição de carros no Brasil à criatividade: um Del Rey limusine. "A Ford autorizou a Souza Ramos (SR), que era a maior revenda do país na época, a modificar o carro, para ele ficar mais luxuoso. Então ele vinha com bancos de couro e teto solar. O carro foi esticado no meio para parecer uma limusine. Era uma espécie de fora de série e a fábrica autorizava, acompanhava o serviço e dava garantia", conta Róberson. Além do Limo, a revenda ainda concebeu o exclusivo Del Rey conversível. Para não ficar para trás, o Monza Sedan também virou conversível com a revenda Sulan, com fabricação autorizada pela Chevrolet. "Esses foras de série autorizados têm um valor histórico muito grande, porque fazem parte de uma época em que uma necessidade fazia com que se criassem carros diferenciados,” ressalta Azambuja.
Simca
Foram fabricados no Brasil com a licença da marca européia. Simca Rallye, Simca Jangada e Simca Chambord. Esses belos franceses hoje ostentam a imponência e o reconhecimento da placa preta. “São carros originais com mais de 30 anos. Essa placa é colocada no carro com autorização do Detran. Para isso ele tem que ter uma certificação de originalidade da Federação Brasileira de Automóveis Antigos,” explica Azambuja. O Simca Jangada tem uma particularidade em relação aos demais. “É muito raro no país, mas aqui no Rio Grande do Sul têm muitos. Lançado em 1962, na grande fase do trigo, muitos fazendeiros gaúchos acabaram comprando.”
Ford Thunderbird
O Thunderbird 1955 era um carro americano construído pela Ford para concorrer com o Corvette que havia sido lançado um ano antes pela Chevrolet. Conversível, com duas capotas, uma de lona e outra rígida, era um m carro esportivo, compacto. “Nos bancos de trás mal cabe uma criança." O carro foi encontrado em uma fazenda no interior de Carazinho e pertenceu a Família Sabadin, dona de uma empresa de ônibus. "Os dois foram restaurados aqui em Passo Fundo: mecânica e funilaria.” No interior dos veículos a riqueza e atenção nos menores detalhes impressionam. Os estofamentos, mesmo um pouco rasgados, são remendados para manter a originalidade, até mesmo nas costuras. "Buscamos sempre manter o carro como saiu de fábrica."
Museu
Munidos da vontade de levar o conhecimento e a cultura que transbordam o território das garagens, surgiu a idéia do Museu do Automóvel. "Chegamos a um ponto de resgate histórico que não dá para manter fechado, existe a necessidade de mostrar as peças para quem tiver interesse em vê-las, para que saiba como eram as soluções dos projetistas da época, que carros nossos pais e avós dirigiam”, explica Róberson entusiasmado. "Cinqüenta anos é muito pouco tempo de história. Muitos carros ficam no tempo, são prensados e vão para as metalúrgicas. O museu seria o instrumento para salvar essa parte da história da indústria automobilística nacional."
Mas o projeto quase escapa da cidade. "Tínhamos um projeto grande com a prefeitura de Porto Belo, em Santa Catarina. A professora Tania Rösing ficou sabendo e disse que isso tinha que ser feito aqui. Não foi muito difícil nos convencer", sorri. A Fundação Universidade de Passo Fundo cedeu uma área no campus para a construção do museu, que fará parte do UPF Mundi. O projeto foi encaminhado ao Ministério da Cultura e já conta com a intenção de algumas empresas em investir no empreendimento que, segundo Azambuja, deve ficar pronto em aproximadamente um ano e meio.
(Fotos: Paulo Roberto D'Agustini/ON e Arquivo Pessoal)
Meus amigos peço permissão para publicar esta reportagem que fiz, que em nada tem a ver com esporte, ou com futebol, mas se trata de mais uma paixão nacional.
quarta-feira, 1 de outubro de 2008
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