segunda-feira, 26 de maio de 2008

Ele continua jogando bonito

Juscemar Borilli: dois anos depois de ter vencido o Joga Bonito, programa de TV da Nike que selecionou um entre 4.400 atletas, o garoto de Tapejara segue carreira na Europa


Desde cedo, Juscemar teve que enfrentar grandes desafios. Nem tanto pela estatura, compensada pela técnica apurada, mais pelo sonho de se tornar jogador de futebol em um país em que 11 em casa dez meninos têm esse objetivo. Vindo de Tapejara, o garoto jogava pelo Genoma Colorado de Passo Fundo, escolinhas criadas no interior com o apoio do Internacional, que funcionavam como peneira. Em março de 2006, surgiu a oportunidade de participar do Joga Bonito, programa de TV, com formato da Nike e transmitido pela Bandeirantes, que selecionava um garoto para se tornar jogador de futebol. Antes de ir para o programa, Juscemar havia feito testes no Internacional.

Joga Bonito

"O Joga Bonito foi a coisa mais importante que aconteceu na minha vida," diz o garoto. Foram 17 mil jovens inscritos. Desses, 4,4 mil foram a São Paulo para uma avaliação. Desses saíram 70, mais tarde reduzidos a 24, que passaram por avaliações no centro de treinamento de Jarinu (SP). Entre os avaliadores, feras como Wanderley Luxemburgo, Careca, Júnior e Lucho Nizo, técnico da seleção brasileira sub-17. "Fui tranqüilo, vi toda aquela gente, sabia que era difícil conseguir. Entrei no Pacaembu - nunca tinha estado num estádio grande - e fiquei até meio nervoso, mas deu tudo certo. Tudo aconteceu naturalmente. Sempre treinei bastante, a oportunidade veio e consegui aproveitar."

No roteiro da conquista, Juscemar bateu bola com Adriano Imperador, ganhou seis meses de contrato no sub-17 do Corinthians e podia escolher entre fazer estágio na Inter de Milão ou na Juventus da Itália. Mas pensando na carreira, foi direto para a Europa. O garoto abdicou do contrato com o Corinthians e, na metade daquele ano, já treinava no homônimo italiano do Inter: a Internazionale.

O prêmio do Joga Bonito previa 15 dias de estágio no clube italiano, entretanto Juscemar acabou ficando três meses entre os juvenis. Nesse tempo, devido à origem italiana, tentou obter cidadania. Giuseppe Baresi, ex-jogador e coordenador das categorias de base da Inter, irmão do ex-capitão da seleção italiana, Franco Baresi, queria manter o garoto, mas o clube exigia o passaporte comunitário.

Holanda


Nesse meio tempo, um empresário holandês ofereceu a Juscemar uma oportunidade no Ajax da Holanda, que tem forte trabalho nas categorias de base. O empresário também é procurador do zagueiro Stam, do próprio Ajax, e do atacante Kluivert, do Lille da França. Com a ajuda do empresário, o garoto obteve a cidadania e ficou por dois meses treinando entre o elenco juvenil e equipe B do time holandês. Porém não ouve acerto contratual e Juscemar acabou indo para o Zwolle, da segunda divisão. Lá, disputou cinco partidas pela equipe principal e marcou um gol, o do empate na estréia do time, que pode ser visto no http://br.youtube.com/watch?v=F7pw9gET1Nc.

"Se analisarmos, seria melhor ele ter ficado na Inter. Mas não íamos prejudicar o empresário que havia nos ajudado a conseguir o passaporte. Depois, seria melhor termos ficado no Ajax. Mas estar em um país em que a língua não ajuda e depois de o empresário estar dando toda estrutura para nós. Não poderíamos ter dito não. Fomos na confiança para o Zwolle," explicou Valnei Rosanelli, que cuida do garoto. Juscemar perdeu o pai muito jovem. Sua mãe mora em Tapejara e seu irmão, de 13 anos, está louco para jogar na Europa. "Sou como um pai para o Juscemar. Se você não tem alguém te apoiando, você desiste. Muitos acabam voltando," finalizou o ex-técnico de categorias de base.

Itália

Eles não se arrependem de terem saído do clube italiano, que tem pouco histórico de utilização da base. "Todos que treinavam com o Juscemar foram embora. Como o clube tem dinheiro compra jogadores prontos. Outra diferença é que no Brasil a maioria dos garotos é de origem humilde, enquanto que lá eram de classe média, o futebol não é uma oportunidade para eles," conta Valnei.

"O campeonato holandês para início é muito bom. Se ele ficasse na Inter, não teria aprendido 50%," comentou ainda Valnei. "O futebol lá é muito pegado. Assemelha-se ao inglês, é mais duro que na Itália. A partida é muito corrida. Foi bom, porque peguei muita experiência," explicou Juscemar. O Zwolle acabou em terceiro, mas não obteve o acesso para a primeira divisão. "É um clube que está investindo bastante. Tem um novo CT e gastou 5 milhões de euros em reformas no estádio," conta Valnei.

Durante a temporada que passou no Zwolle, da segunda divisão holandesa, Juscemar, jogou um torneio na Itália pela equipe B do clube. "Jogamos contra a Cremonese e surgiu o convite para fazer um teste lá." Aprovado, o garoto assinou por três anos com o time da cidade de Cremona, na Itália, que ficou em 2º na C1, espécie de terceira divisão regional. Atualmente o Cremonese disputa as semifinais dos play-offs de acesso contra o Foggia. "Na Itália a vitrine é um pouco maior. Quem sabe ele pode ir às seleções italianas menores," explica Valnei Rosaneli, que cuida do garoto na Europa. "O clube está se reestruturando após ter caído da série A devido a problemas financeiros do antigo dono. O plano da diretoria é seguir os passos do Napoli."

Amizades


Do mundo glamouroso do futebol europeu, Juscemar guarda boas lembranças. No Ájax, treinou com o ídolo Edgar Davids (foto), volante holandês. "Estava no treino. De repente vi aquele jogador de óculos amarelos... Era ele. Como falo um pouco de italiano e ele também, puxei conversa. Ele foi muito bacana, perguntou se estava bem e me desejou sorte." O garoto é amigo do atacante Ricardo Oliveira, atualmente no Real Zaragoza. "Quando ele foi para o Milan, fomos visitá-lo no Milanello [centro de treinamento do clube italiano], assistimos ao treino, depois fomos para a casa dele."

Mas a adaptação aos costumes do velho continente foram difíceis no começo. "Na Holanda, o problema era a língua e a comida. Como todo mundo fala inglês, com o pouco que a gente sabe dá para se virar. Ao meio-dia acabava o treino. Em uma mesa cada jogador fazia um sanduíche, depois tinha frutas, e só... Não tinha almoço. Em todo lugar era assim. Depois, lá pelas 17h, o pessoal jantava, quando abriam os restaurantes. O frio dificultou um pouco, mas nada que a gente não tenha sentido aqui no Sul, até porque lá eles tem estrutura para suportar isso," explicaram Juscemar e Valnei.

Mesmo assim a jovem promessa não pensa em atuar no Brasil tão cedo. "Por enquanto pretendo fazer minha carreira lá. Seria muito bom jogar em um time grande aqui. Quem sabe no Grêmio, meu time do coração, mas isso seria mais para a frente," confessa. O mesmo pode ser dito sobre seleção. "Se houvesse oportunidade de vestir a camisa da Itália, aceitaria. No Brasil há muita concorrência," confessa Juscemar Borilli, que possui dupla cidadania.

Estilo


Habilidoso, Juscemar, no Brasil, era escalado como meia-criativo. Na Europa a história foi outra. "Fui para a ponta. Foi uma mudança grande. Quando cheguei, perdia muitas bolas no meio. Queria carregar mas lá você tem que tocar rápido e driblar só na frente da área. Meu jogo se tornou mais veloz," garantiu. O técnico do Zwolle, Jan Everse, ex-jogador do Ajax, foi quem percebeu o potencial do garoto na frente. "Ele resolveu apostar na minha velocidade e deu certo," comentou. "O Juscemar tem muita força de vontade. Essa é sua principal característica. Além de ser muito disciplinado e focado naquilo que quer: fazer carreira como jogador," explicou Valnei Rosaneli.

Juscemar Borilli tem um pré-contrato com a Cremonese. Em julho assina em definitivo. De acordo com Valnei, o empresário italiano que cuida da negociação, ele estima que a multa rescisória será avaliada em 2 milhões de euros. Ainda segundo Rosaneli, no contrato deverão constar cláusulas que premiam o jogador conforme seu desenvolvimento, além de prêmios e bonificações.

Apesar de ter conhecido Adriano, Ricardo Oliveira e Davids, Juscemar confessa sua admiração por Ronaldinho Gaúcho, ao mesmo tempo que lamenta a atual fase do craque dentuço. Atualmente, quem atrai as atenções do garoto é o português Cristiano Ronaldo, atacante do Manchester United, campeão da Liga dos Campeões da Europa.

Ficha técnica
Nome: Juscemar Borilli
Idade: 18 anos (12/01/1990)
Natural: Tapejara
Altura: 1,75 m Peso: 70 kg
Posição: atacante (destro)
Clubes: Internazionale/ITA, Ajax/HOL, Zwolle/HOL, Cremonese/ITA
Características: velocidade, técnica e visão de jogo

(Fotos: Arquivo Pessoal/JB)

ON # 040 - Qualquer semelhança..; Mais chance para base; Re: a mais bonita capa de jornal; Tudo tem sua lógica futebolística...

Qualquer semelhança...


Na semana passada inauguramos um espaço "youtubeano" na coluna com o link de um vídeo que supostamente mostra Cristiano Ronaldo e Alexandre Pato em um bate-bola. Porém, o leitor Jackson escreve informando que o jornalista Wianey Carlet, em seu blog, desmente a participação do jovem craque do Milan. Segue o post: "Um vídeo que circula há cerca de três semanas no You Tube, em que o craque lusitano Cristiano Ronaldo aparece fazendo malabarismos com uma bola dentro de um estúdio de filmagens, levanta uma dúvida: o jovem habilidoso que aparece ao lado do português é Alexandre Pato? Não é. Embora o nome do brasileiro apareça em praticamente todas as versões do vídeo no You Tube, o empresário do jogador, Gilmar Veloz, afirmou ao repórter Jefferson Curtinovi, de zerohora.com, que o brasileiro não participou da gravação. A hipótese mais provável é de que se trate de Billy Wingrove (foto), inglês conhecido por fazer malabarismos com a bola".

Confira em http://br.youtube.com/watch?v=QUxjETGdPdA

(Foto: Divulgação)


Mais chance para a base

Amaral, ex-Vasco, chegou ao Grêmio para o Brasileirão afirmando que saía do clube carioca porque Antonio Lopes, técnico vascaíno, daria mais chance aos garotos das categorias de base. O problema é que Amaral é contratado justamente para posição em que o tricolor tem dois jovens que vem se destacando: William Magrão e, especialmente, Rafael Carioca. O último, de 18 anos, cheio de personalidade, diz não haver problema na concorrência com os mais experientes, porém de qualidade duvidosa, jogadores. Pior é que Makelele, outro volante, ex-Palmeiras, também desembarcou no Olímpico. Sem falar no juvenil Tiago Dutra, que, junto com o meia Douglas Costa, vendo sendo assediado por Real Madrid e Barcelona. O diretor executivo gremista, Rodrigo Caetano, garante: os jogadores trazidos reforçam o elenco, mas não tomam o lugar dos pratas da casa no grupo.

Re: a mais bonita capa de jornal

Na semana passada publicamos a reprodução da capa de O Nacional do dia 8 de novembro de 2004, segunda-feira, após a classificação do Gaúcho para a final da Copa RS em cima do Internacional, que está no álbum de fotos do leitor Volmar Godinho em um site de relacionamentos com a descrição: "Mais bonita capa de jornal do mundo". O torcedor escreve: "Paulo. Sou leitor assíduo do jornal e da tua coluna. Para minha surpresa, hoje pela manhã, vi meu nome no jornal e a foto da "Mais bonita capa de jornal do mundo", que possuo no meu perfil do Orkut. Minha família toda é torcedora do Gaúcho e lamentamos a difícil situação que o clube se encontra. Ainda bem que existem pessoas como você que dão valor ao esporte local, seja ele amador ou profissional. Forte abraço, Volmar".

Tudo tem sua lógica futebolística...


Inclusive o Gre-Nal de integração dos boleiros da UPF, realizado na última quinta-feira (22) e vencido pelos tricolores pelo placar de 6 x 3. Diferente do confronto zerado este ano entre os profissionais, aos colorados "universitários" resta esperar até 2009 para a revanche. Até lá, a corneta vai rolar solta...

(Foto: Divulgação)

quarta-feira, 21 de maio de 2008

A nossa Anna Paula

Formada pela Federação Mineira de Futebol, a passo-fundense de coração - como define - Anna Paula Cristoffoli Torres se tornou árbitro de futebol. Mas evite comparar essa gaúcha de 25 anos nascida em Ijuí e de personalidade forte com a bandeirinha paulista Ana Paula de Oliveira. Confira essa arriscada entrevista.




O Nacional - Como surgiu essa história de se tornar árbitro de futebol?
Anna Paula - Bom, desde nova eu sempre tive muito contato com futebol. Meu irmão é fanático. Depois me casei com um outro fanático. Quando o Internacional perdeu o título brasileiro, há dois anos, fiquei indignada com os erros de arbitragem. Mas hoje lido com essa questão de maneira profissional. No ano passado eu comecei a observar mais as arbitragens. Comecei a ler mais, me informar sobre regras e acabei me interessando em fazer o curso.

ON - E como foi o curso?
AP - Foram oito meses de aulas, minha formatura foi em 3 de dezembro. O curso me habilita a arbitrar nos campeonatos regionais, inicialmente aqui em Minas, e a partir do próximo ano já estarei em treinamento para os testes da CBF, teórico e prático.

ON - Que parte foi a mais difícil?
AP - A parte mais difícil é colocar a teoria na prática. Você tem a regra e as instruções na cabeça mas quando está no campo tudo é muito rápido, as decisões tem que ser tomadas em segundos. Isso é uma dificuldade no início, pois não pode haver dúvidas. Você tem que estar consciente e decidido para tomar qualquer atitude. Essa parte se estende agora depois de formada, principalmente nesse primeiro ano.

ON - Mas você já apitou alguns jogos, qual foi o mais complicado?
AP - Foram três jogos: dois do campeonato mineiro júnior e uma final feminina da Copa Centenário, em Belo Horizonte. Nessa final feminina atuei como quarto árbitro e, para ser sincera, foi a mais "complicada".

ON - Por quê?
AP - Existe um certo preconceito da parte dos homens quando se deparam com um árbitro feminino, mas, em seguida, o respeito e a educação equilibram. Já com as mulheres foi um pouco diferente. Elas não têm muito limite, porque se sentem no mesmo nível e, de certa forma, estão, por sermos do mesmo sexo, mas no futebol, a arbitragem é a autoridade máxima dentro do campo de jogo, e elas muitas vezes não conseguem entender tal hierarquia.

ON - O que a família achou da sua escolha? O marido não fica com ciúmes?
AP - Essa é uma escolha em que tem que haver o apoio de todos na família, principalmente do marido. Antes de fazer o curso conversamos muito sobre o assunto. Ele achou que eu tinha perfil para arbitrar, pois aqui em Minas eles me acham "brava" (risos), normal de gaúcha, ter personalidade forte. Além disso tem me incentivado bastante nos treinamentos e também estudado comigo os jogos. Minha mãe falou que vai começar a torcer pelos árbitros (risos).

ON - Cite algum árbitro que você admire.
AP - Paulo César de Oliveira. Considero ele bem coerente e sereno.

ON - Qual é o sonho para a carreira? Quais os objetivos?
AP - Tenho que treinar muito, me condicionar bastante para poder atingir os objetivos. Na arbitragem não basta ter conhecimento teórico, tem que ter um bom preparo físico. Estou me preparando para esse ano começar de fato a arbitrar, adquirir experiência nos campeonatos amadores e juniores, para rapidamente atuar no profissional. Pretendo em, no máximo, três anos estar no quadro da Confederação Brasileira de Futebol. E em 2014 atuar, pelo menos, como 4º árbitro na Copa do Mundo aqui no Brasil (risos).

ON - E o preconceito, como lidar com ele?
AP - Com humildade, respeito e capacitação conseguirei o meu espaço. Creio que é um grande momento, o futebol feminino no próximo ano contará com mais incentivo, assim, conseqüentemente, a arbitragem feminina também irá se beneficiar. Não adianta reclamar do preconceito e sim agir contra ele. Se homens e mulheres estão sendo testados de forma equivalente, acho que já é um grande passo para o preconceito diminuir.

ON - Não tem como não perguntar: rola muita brincadeira por causa do seu nome?
AP - (Silêncio) Bom, quando eu entrei no curso, meu professor me apresentou assim: 'Já que a federação paulista tem uma Ana Paula, nós aqui em Minas também temos uma, só que essa é loira, gaúcha e brava!' Aí, na turma, não houve brincadeiras e todos sempre me ajudaram e respeitaram meu nome. Mas é inevitável pessoas de fora não compararem com a Ana Paula paulista, mas logo eles observam a enorme diferença entre as duas e aí o assunto se encerra. Já estou acostumada a essa comparação. O dela é com apenas um "N" e o meu é com dois (risos).

ON - Posar nua, nem pensar? (risos nervosos)
AP - (Silêncio maior) Posar nua nunca, de jeito nenhum, é contra os meus valores.

(Foto: arquivo pessoal/AP)

terça-feira, 20 de maio de 2008

Dos apitos e cartões para TV

Renato Marsiglia: o ex-árbitro, hoje comentarista, fala sobre carreira, nível de arbitragem, profissionalização e recursos eletrônicos - "Existe o jogo do campo e o da TV"




O gaúcho Renato Marsiglia foi árbitro de basquete e futebol, economista e analista de sistemas, mas depois que abandonou a arbitragem se formou em Jornalismo e decidiu se dedicar exclusivamente ao esporte. Sem achar que a instituição deve ser julgada pelo caso Edilson, Marsiglia hoje é um comentarista de opiniões fortes. Acredita que deveria haver um filtro para seleção de profissionais de arbitragem. Em 1994 viveu seu melhor momento nos EUA. Poderia ter emplacado três árbitros brasileiros nas últimas quatro finais de Copa do Mundo. Caso o Brasil não tivesse sido tetra: "Ficou bom assim. O esporte me abriu muitas portas." Confira a entrevista exclusiva com o colunista de ON.

O Nacional - Você começou com árbitro de basquete. Como foi isso?
Renato Marsiglia - Fui jogador de basquete do Grêmio Náutico União, no fim da década de 1960. Quando eu entrei na universidade acabei parando em função dos horários. Fui convidado a apitar jogos e acabou dando certo. Cheguei a ser árbitro internacional da FIBA [Federação Internacional de Basquete], apitei várias decisões de Brasileiros, Sulamericanos e inclusive a final dos Jogos Panamericanos de Porto Rico em 1979, entre Estados Unidos e Cuba. Naquela época a Guerra Fria era muito forte e o ginásio estava lotado. Aquele foi um marco, mas não houve qualquer tipo de pressão sobre a arbitragem.
Naquele Pan conheci o José Roberto Wright, que era árbitro do Brasil de futebol. Ficamos amigos. Ele vinha apitar jogos em Porto Alegre e se hospedava na minha casa, como naquela famosa semifinal entre Inter e Palmeiras em 1979. Ele me convenceu a fazer o curso de árbitro de futebol me dizendo: 'Quanto você ganhou para apitar a final do Pan?' 'O equivalente a US$ 50.' 'Para apitar aquela semifinal do Brasileiro eu ganhei 60 vezes mais que você. E te chamam de ladrão igual...' Em 1980 fiz o curso de árbitro de futebol. Em 1981 ainda apitei basquete e futebol ao mesmo tempo. Aí não deu mais para conciliar porque são esportes com características diferentes. Por exemplo, no basquete não tem a lei da vantagem. A falta é importante. No futebol uma das marcações mais bonitas é uma lei da vantagem bem aplicada. Acabei optando pelo futebol e desenvolvendo a carreira.

ON - Qual o jogo mais marcante da carreira nos dois esportes?
RM - No basquete evidentemente a final do Panamericano entre Cuba e Estados Unidos e no futebol sem dúvida nenhuma os dois jogos que apitei na Copa do Mundo de 1994 nos EUA: Bélgica 1 x 0 Holanda na fase de grupos e depois nas oitavas-de-final Suécia 3 x 1 Arábia Saudita.

ON - Acredita que teria apitado mais jogos caso o Brasil não tivesse avançado?
RM - Nunca divulguei isso, mas quando parei recebi uma carta pessoal do João Havelange (na época presidente da FIFA) agradecendo os serviços prestados e informando que teria sido árbitro da final pelas minhas boas atuações, a Comissão de Arbitragem já havia me selecionado, caso o Brasil não tivesse chegado.

ON - Que árbitros você destacaria positiva e negativamente na carreira?
RM - Negativo eu vou passar batido, mas o José Roberto Wright [apitou nas Copa de 1990 na Itália e 1994 nos EUA], sou suspeito, é meu amigo pessoal, Romualdo Arpi Filho [árbitro da final da Copa de 1986 no México, Argentina 3 x 2 Alemanha], um árbitro extraordinário e em nível internacional o Juan Carlos Loustau, da Argentina [apitou a final do Mundial Interclubes de 1992, São Paulo 2 x 1 Barcelona], um árbitro de primeira linha.

ON - E entre os jogadores?
RM - Entre aqueles que apitei o Marco Van Basten [atacante, técnico da Holanda], para mim foi o maior centroavante do mundo. Na Copa de 1994 não foi, estava machucado, mas naquele time jogava o Rijkaard [volante, ex-técnico do Barcelona] um jogador extraordinário. Romário, fantástico, apitei muitos jogos dele quando atuava no Vasco. Além do Zico, claro, espetacular.

ON - Como era lidar com essas "feras" em campo?
RM - O Romário era o mais fácil de lidar. Não falava, não incomodava, não causava problema, não discutia com adversário. Apitar jogo com 22 Romários seria tarefa para qualquer criança. Além de ser um jogador extraordinário.

ON - Faça uma avaliação do nível da arbitragem brasileira hoje.
RM - A redução da idade de 50 para 45 anos criou um vácuo, porque muitos árbitros de bom nível tiveram que abandonar repentinamente. E aí você tem que refazer todo um trabalho e isso não leva menos que 7 ou 8 anos para formar. Só vai dar resultados depois que for um árbitro nacional e começa a disputar vagas na FIFA. Então é um período de maturação longo onde muitos ficam pelo caminho. Então você não tem muita quantidade para tirar qualidade. Ainda acho que a arbitragem brasileira, como em qualquer atividade, é melhor preparada hoje que antigamente. O grande problema de agora é a concorrência desleal com os recursos eletrônicos, especialmente a televisão. Os erros de arbitragem hoje são extremamente potencializados pelo recurso da TV. Fico orgulhoso quando dizem: 'no teu tempo não acontecia isso...' Mas também não tinha tudo o que tem hoje. Se tivesse, talvez meus erros aparecessem em um número maior. Então as pessoas têm que entender que hoje a televisão não existe para crucificar o árbitro. Ela existe para jornalisticamente mostrar o certo e o errado. Existe um jogo do campo e o jogo da TV. Já aconteceu comigo de sair do estádio e pensar que o árbitro havia ido bem. Depois ligava a televisão e os lances mostravam o contrário. Então você tem o congelamento de imagem, o slow motion, o quadro parado, o tira-teima, 24 câmeras, além da visão de cima para baixo. O árbitro dentro de campo só tem os olhos, está correndo, cansado, estressado e pressionado pela TV. O jogo do campo é o esporte e o jogo da televisão é o business. Tem de haver um cuidado da parte dos comentaristas de falar aquilo que é um erro por uma deficiência técnica. Quando você precisa ver na televisão um lance várias vezes para saber se o árbitro cometeu um erro, o que houve foi uma limitação do ser humano. Isso é comprovado cientificamente.

ON - Sobre a profissionalização e o uso de recursos eletrônicos no futebol.
RM - Na medida em que se tem um árbitro melhor preparado técnica, física e psicologicamente, que se dedique integralmente é evidente que ele vai errar menos. Hoje o árbitro tem a semana inteira de atividades para no sábado e domingo apitar e correr contra rapazes de 20 anos que treinam com estrutura profissional, enquanto que a estrutura do árbitro é toda amadora.
Quanto aos eletrônicos não sou muito favorável. Não que não fosse bom poder usar é que o difícil seria você operacionalizar sem tirar a naturalidade do esporte. O nosso futebol, diferente do americano, é um jogo que quanto mais fluir melhor. O americano ao contrário. Quantas vezes a gente vê na televisão seis pessoas numa mesa redonda sem chegar a conclusão sobre um lance. Então você tem que dar as melhores condições possíveis de humanamente o árbitro errar o mínimo.

ON - Porque o jogo no Brasil e na Europa, no Brasileiro e na Libertadores, é tão diferente?
RM - Vai muito da forma não só do árbitro, mas principalmente da maneira como os jogadores encaram profissionalmente o esporte, e acima de tudo da estrutura de disciplina. As punições na Europa são muito mais duras que aqui. Então o jogador não faz porque sabe que lá não há impunidade. Isso é uma cultura também do país. E o futebol é uma conseqüência disso.

ON - Que árbitros da nova geração você destacaria?
RM - O Evandro Roman do Paraná que entrou na FIFA esse ano é um bom árbitro. Tem uma formação pessoal muito boa. É Doutor em Preparação Física pela Unicamp e professor universitário. Se mantiver o foco e o rumo vai longe.

ON - Como deve ser a relação entre árbitro e jogador?
RM - É muito de temperamento. Acho que independente de ser mais ou menos prolixo dentro de campo o árbitro não pode abrir mão da disciplina, tem que ser enérgico sem ser mal-educado. Ele tem que usar o poder de árbitro que a regra lhe confere, mas não confundir com arbitrariedade. Aquele que conduz o jogo com autoridade e personalidade é o bom árbitro.

ON - O que acha dos árbitros e jogadores que seguem o jornalismo?
RM - Não vejo problema. Se tiverem a oferecer em termos de qualidade e experiência para o enriquecimento das transmissões ótimo. Há necessidade de conhecimento do que vai falar e de ética jornalística, ou seja, uma bagagem pessoal para exercer a atividade. Além de uma pessoa articulada, que saiba transmitir informações de qualidade.

(Foto: Arquivo Pessoal)
Legenda: Com João Havelange, presidente da FIFA, na Copa de 1994

segunda-feira, 19 de maio de 2008

ON # 039 - "A mais bonita capa de jornal do mundo!"; Bárbaros russos; Amostra grátis

Colaboração: Marcelo Alexandre Becker/ON

"A mais bonita capa de jornal do mundo!"


Na semana passada o Sport Club Gaúcho voltou a ser pauta em razão da passagem dos seus 90 anos de fundação. Espiando dez anos atrás, na edição de O Nacional da mesma data em 1998, encontramos uma situação parecida com a de hoje: o departamento de futebol profissional desativado e a manutenção de escolinhas, incluindo a expectativa de uma parceria com o São Paulo Futebol Clube. Hoje, diferente de ontem, a escolinha conta apenas com o nome "Gaúcho" e o estádio Wolmar Salton está destruído. Até existe a iminência de sua retomada.
Mas há quem diga que o maior patrimônio do clube é sua torcida: apaixonada e fiel. Um exemplo disso é o registro de uma foto na página pessoal do site de relacionamentos Orkut do leitor Volmar Godinho: nela está a reprodução da capa de ON do dia 8 de novembro de 2004, segunda-feira após a vitória e classificação do Gaúcho a final da Copa RS daquele ano, em cima do Internacional, 1 x 0. Abaixo uma frase de Volmar: "A mais bonita capa de jornal do mundo!" O torcedor faz parte da comunidade do clube, que conta com mais de 700 integrantes. Através de fóruns eles comentam a atual situação e relembram as glórias do passado.

(Foto: Reprodução)


Bárbaros russos


Logo após a vitória do Zenit São Petesburgo, da Rússia, sobre o Glasgow Rangers, da Escócia, na final da Copa da Uefa da última semana, torcedores russos invadiram o gramado para comemorar a façanha do clube. Faz parte da festa. Mas antes da partida, a polícia inglesa (a final foi em Manchester) havia contabilizado seis pessoas feridas e um escocês esfaqueado.
Mas a zebra russa, apesar do futebol bonito que surpreendeu positivamente, conta com torcedores piores que os capazes de esfaquear uma pessoa (acreditem!). O técnico da equipe, o holandês Dick Advocaat, treinador da seleção do seu país na Copa de 94, foi impedido de contratar jogadores negros. Tudo porque a torcida não toleraria tais reforços - é o único clube da Rússia que não conta com jogadores de pele negra. O máximo de estrangeiros no time são dois sul-coreanos, um argentino e um turco. O resto são nacionais ou do leste europeu. Em alguns jogos é possível ver torcedores do Zenit com capuzes da KKK (Ku Klux Klan), organização racista norte-americana que apoiava a supremacia branca, além de torturar e matar negros no sul dos EUA. O belo futebol perdeu toda graça.

(Foto: Divulgação)


Amostra grátis

Inaugurando espaço "youtubeano" na coluna, indico pequena amostra de habilidade do atual e do futuro melhores jogadores do mundo: Cristiano Ronaldo e Alexandre Pato batem bola num estúdio onde estão sendo captadas imagens para a versão 2008 do sucesso do vídeo game, Pro Evolution Soccer. Detalhe: Pato vestia calça jeans durante a brincadeira.

Confira: http://br.youtube.com/watch?v=QUxjETGdPdA

domingo, 11 de maio de 2008

ON # 038 - Gaúcho - 90 anos; "A bola pune..."; A polêmica do bicho; Ficam três; Ex-boleiros

Gaúcho - 90 anos

Durante a semana passada conversei com ex-dirigentes, ex-jogadores, nomes que marcaram a história quase centenária do "Mais querido da cidade". Em alguns momentos, confesso, senti uma ponta de inveja. Inveja de não ter vivido uma era romântica do futebol, uma época de ouro para o esporte passo-fundense. Deixando a nostalgia de lado, verifico rapidamente que o momento atual é um dos piores da história do clube e o palco de todo imaginado está bem diferente.
Mas, no excelente livro O mais querido da cidade, de Marco Antônio Damian, que conta a trajetória de 1918 até 2000, um trecho profetiza e dá esperança aos mais apaixonados: "Enquanto houver futebol, existirá o Gaúcho."


(Foto: Arquivo Pessoal/Marco Antonio Damian)
Bexiga, Orlando, Chiquita, Luiz Sachett, não identificado e Itamar; Vetinho, não identificado, Branco Ughini, não identificado e Paulista, em 1957


Frase da semana

"A bola pune..."

Do técnico do São Paulo, Muricy Ramalho, sobre a eliminação vexatória do Flamengo na Copa Santander Libertadores após ter vencido a primeira partida contra o América, no México, por 4 a 2 e ter perdido no Maracanã por 3 a 0. O agora técnico da seleção sul-africana Joel Santana e os jogadores rubro-negros teriam desdenhado do adversário e entrando em campo calçando o velho salto alto. Jornais mexicanos apelidaram o feito do América, como um novo "Maracanazzo".


A polêmica do bicho

A final do Gauchão da semana passada não sai da cabeça, nem de colorados, nem da papada, nem dos gremistas, nem de ninguém. Os 8 a 1, maior diferença de gols em uma final de Estadual, foram estarrecedores demais. Fora a grande sanha de vingança e a estupenda atuação do Inter contra a touca verde, o que alguns, até mesmo colorados, viram foi um Juventude apático, leia-se jogadores sem a menor indignação. Nenhum expulso, apenas o capitão para receber as medalhas do vice e a grande pergunta que não quer calar: porque não entraram em campo na hora do hino. Com todos esses fatores, pode-se supor que o bicho foi acertado, ou melhor, não acertado, antes da partida. No final do jogo, o diretor do Ju, José Antonio Boff, declarou, sem afirmar: "o que aconteceu foi grave, não vai passar impune."

Ficam três

O vice-presidente de futebol do Passo Fundo, Ivanir Rodighiero, confirmou no sábado, durante a derrota dos juvenis para o São Luiz, que apenas o goleiro Róbson, o volante Baiano e o atacante Índio permanecem no Vermelhão da Serra. Ainda segundo o dirigente, o restante dos atletas foi dispensado essa semana. Os três atletas que permaneceram vão auxiliar na preparação dos mais jovens. "Não tínhamos como manter os atletas sem estar disputando," lamenta. O Passo Fundo disputa a Copa RS que começa apenas daqui a quatro longos meses, em agosto.


Ex-boleiros


No sábado (10), um agradável churrasco, regado à boa conversa e belas risadas, reuniu os ex-boleiros do Garden Club. A confraternização organizada pelos ex-craques do campo de cima do clube Osmar Teixeira e Ludgero Cruz teve como palco a Cabanha Santa Mônica. Destaque para a despedida dos gramados, aos 61 anos e devido a uma lesão, do lendário Seu Carlinhos. Disseram as más línguas que o quórum do evento foi maior que o das peladas de sábado no Garden. Naturalmente.

(Foto: Paulo Roberto D'Agustini/ON)

segunda-feira, 5 de maio de 2008

ON # 037 - Arrasador. E a touca?; Bastidores do Colosso da Lagoa: Charuto, Turrão, Banner e Trapos; Brasileiro de Xadrez

Arrasador. E a touca?


O Internacional conquista seu 38º título gaúcho (o Grêmio fica com três a menos) com o mérito de ter sido nem o melhor, nem o pior, mas o mais efetivo time do campeonato. Tem Alex, o melhor jogador em atividade no Brasil, Guiñazú, volante espetacular, o decisivo capitão Fernandão e um dos melhores elencos do país. Um sistema de jogo eficiente chamado de "carrossel", e até de "bergamota mecânica", onde todos defendem e atacam. Sistema esse que só havia falhado ante o Juventude, a velha touca. Três jogos e três derrotas. Um distúrbio psicológico que parte dos próprios jogadores, no pré-jogo, durante as entrevistas: "dessa 'vez' acabamos com a touca". Esquecem das diferenças técnicas evidentes entre os dois. Aí vai lá o Ju e faz "Copa do Mundo". Mas a farra acabou neste domingo com uma arrasadora goleada e a força de mais de 50 mil. E o Ju, acoado, provou do próprio veneno.

(Fotos: Jefferson Bernardes/VIPCOMM)


Bastidores do Colosso da Lagoa

Charuto

O médico do Grêmio, Alarico Endres, fumava um vistoso charuto, digno de dar inveja aos cohibas de Fidel, no banco de reservas do gramado em Erechim, antes do início do amistoso entre Ypiranga e Grêmio, quinta-feira (1º). Nem o vice de futebol, André Krieger, que concedia entrevista a beira do campo, suportou: "Pô Alarico, apaga esse troço fedido!" Ordens do novo chefe atendidas.

Turrão


O técnico gremista, que se apresentou "um novo Roth", mais "light", na sua terceira passagem pelo clube, depois das desclassificações no Gauchão (segunda-fase) e na Copa do Brasil (segunda fase), voltou a ser "o velho Roth" de sempre. Rebateu perguntas, ironizou, ficou na defensiva, tal qual o time em campo: "a cara de Roth".

Banner

A coletiva após vitória por 3 a 0, construída no segundo tempo, seria realizada no túnel que dá acesso ao campo. Eis o banner da assessoria gremista afixado na parede some. Um radialista de Porto Alegre logo dispara: "no interior é assim..." Preconceito hein!

Trapos


A Geral do Grêmio da região, especialmente de Passo Fundo, mostrou sua criatividade nas arquibancadas. Os trapos, como são chamados pela torcida gremista, exibiam mensagens como Força e Honra (alusão ao filme "Gladiador") e até uma perigosa "Diga não ao fair play". Até um, agora tradicional, "Volta Jardel" apareceu (em tempo, o centroavante afirmou que aceitaria um contrato de risco).


(Fotos: Marcelo Alexandre Becker/ON)


Brasileiro de Xadrez

Há a possibilidade de Passo Fundo sediar o Brasileiro de Xadrez em dezembro. A indicação partiu da própria Confederação depois da realização do match internacional entre Mequinho e o isralense Alon Greenfeld. Segundo o médico anestesista Juarez Missel, promotor do match, a entidade elogiou a divulgação e a hospedagem - os enxadristas foram considerados hóspedes oficiais do município. O Brasileiro reúne os 12 melhores do país, que se enfrentam entre si em 12 dias. Eles são selecionados através de seletiva e ranking internacional. A premiação total chega a R$ 15 mil. Mequinho não participa desde 1967, quando levou o título, então com 15 anos. Atualmente quatro enxadristas brasileiros têm maior ranking que o gaúcho. Conforme Missel, começa agora a busca por parceiros.