quinta-feira, 6 de março de 2008

Ancheta uncut

No mês passado publiquei aqui uma entrevista especial que fiz com o ex-jogador de Nacional, Grêmio, Millionarios e Celeste Olímpica, atualmente técnico do Esporte Clube Passo Fundo na 2ª Divisão do futebol gaúcho, Ancheta, e que foi publicada no Jornal O Nacional em duas edições. Em função do espaço reduzido, alguns questionamentos tiveram que ser suprimidos da versão impressa. Mas aqui no TTSLF você confere um pouco mais da trajetória de mais um ídolo esquecido pela massa.
(Na foto, Ancheta (2) é o defensor que se atira no lance antológico de Pelé na Copa de 70, quando o Rei dá um drible da vaca em Mazurkiewicz mas a bola não entra.)

ON - Como foram as conquistas com o seu clube de coração: o Nacional.
Ancheta -
Foi maravilhoso. O grupo era muito bom. Para mim o time era superior a seleção uruguaia. Tinha jogadores como o Luis Artime (argentino), Celio Tabeira Filho (brasileiro), que depois jogou no Corinthians, Manga (brasileiro) no gol. O Nacional tinha uma seleção e nós nos sentíamos muito amigos. Havia muita união. Isso era muito importante. Nós corríamos muito, ninguém brigava, todo mundo era pra frente. Foi muito boa aquela época. Ganhamos quase tudo. Era um time desejável para qualquer torcedor. Mesmo assim foi com muito sacrifício porque naquela época também haviam outros grandes times como o próprio Estudiantes de La Plata, nosso adversário na final da Libertadores da América de 1971. Havia muita rivalidade contra os argentinos. Antigamente não tinham tantas câmeras como hoje que não permitem certas atitudes. Então era “pau e pau”. Alguns jogadores do Estudiantes entraram naquela final com alfinete dentro de campo. Perdemos lá, ganhamos em casa e vencemos novamente no terceiro jogo em Lima no Peru. Depois fomos campeões do mundo em cima do Panathinaikos em jogos de ida e volta.

ON - E como surgiu essa de ser cantor de boleiro?
Ancheta -
Nesse mesmo tempo (auxiliar técnico no Avaí/década de 80) a Discoteca (gravadora Ursa Discos atualmente) sabia que eu gostava de cantar. Então eles me convidaram para um teste. Eu aceitei. Nas segundas-feiras eu ia a Porto Alegre, gravar as amostras, cantar. E voltava para Florianópolis continuar o trabalho. Quando terminou o campeonato, eles gravaram um disco e deu certo. A gravadora disse que eu ia ter que voltar para Porto Alegre. Todo mundo ficou muito triste porque criamos um laço familiar muito bom. Foi uma experiência muito boa porque eu era o auxiliar técnico do Sérgio (Lopes, ex-Grêmio) e tratava a parte psicológica, a parte tática, posicionamento em campo, eu comandava. Nos jogos eu para as arquibancadas e levava as estratégias no intervalo para fazer as correções modificações. E fomos campeões.

ON - Foi uma passagem marcante para você?
Ancheta -
Sim. O disco estava gravado. Começamos a fazer as propagandas. Fiz o meu primeiro show numa casa noturna. Nunca tinha cantado para tantas pessoas. Contratamos um conjunto. Os boleros eram muito conhecidos, eles faziam os arranjos e saíamos cantando. Mas o nervosismo foi muito grande naquele primeiro momento. Tinha que cativar o público. Mas deu tudo certo. E tivemos outros shows, ganhamos um bom cachê. Sempre valorizei bastante esse trabalho porque hoje em dia os músicos não se valorizam muito. É uma necessidade. As dificuldades ficam grandes porque cada vez os valores ficam mínimos. E agora ultimamente não estava fazendo muitos shows. Mas foi muito bom para mim e para o público que gostava e vai sentir saudade.

ON - Como ressurgiu essa vontade de ser técnico?
Ancheta -
Depois que eu parei de jogar eu me afastei totalmente, não queria mais saber de futebol, porque no Grêmio eu sofri bastante na saída, achava que não merecia por meu comportamento. Até porque quando voltei para o Brasil queria ser treinador das categorias de base e não me deram bola e aí sim me afastei. Quando vi que não estava sendo reconhecido, tendo 9 anos no Grêmio, eu me afastei. E agora depois de quase 15 anos com escolinhas de futebol eu estava querendo um desafio diferente, não de educação, de fabricar jogadores, mas de montar um time, saber que tenho condições de montar um grupo, de administrar atletas, provei no interior e deu certo em campeonatos municipais, fiz cursos de técnico, além da base muito importante de quem jogou futebol pelo conhecimento do jogador e isso dá muita consistência como técnico. Me decidi e graças a Deus saiu rápido o convite, uma desafio grande porque sei que o Passo Fundo está com dificuldades financeiras para contratação, 70% é gurizada, sabemos que é um campeonato de 2ª divisão que é difícil, mas tem que ter confiança e trabalho para ter resultado.

ON - Ancheta como é a sua família?
Ancheta -
Três são do primeiro matrimônio. O primeiro é o Atílio, tem 38 anos, trabalha com transportes no Uruguai e me deu três netos. Ele tentou ir para o futebol, mas achei que ele não tinha condições, sou muito exigente. Depois tem mais duas: a Gabriela, que me deu netos gêmeos, um vai ser um grande jogador, Rodrigo, e a outra uma grande amazona; e a Bianca, que também me deu dois netos pequenos. Do segundo casamento tenho a Sâmara e o Pietro, que tem 17 anos e uma boa perspectiva de jogar futebol. Ele é valente e tem muita habilidade. Só que ainda é muito magro como eu era e sei que ele não teria chances nos grandes clubes. E só por ser meu filho também não deve ter regalias. Pelo nome não vai ser e sim pelo que ele é. Mas tem condições. Vou tentar que venha começar a treinar aqui para criar físico e quem sabe dar um futuro bom começando aqui no Passo Fundo, porque ele tem uma boa técnica: é meia atacante. Quero trazer ele para morar comigo porque pretendo ficar um tempo aqui se Deus quiser, e que ele aproveite. Vai estudar e treinar num time que dê a ele esse fortalecimento físico e quem sabe um aporte financeiro ao Passo Fundo, já que estamos caçando talentos, que são tão importantes.

ON - Você é gremista?
Ancheta -
Continuo porque meus filhos adoram o Grêmio, nunca influenciei nada - minha esposa é colorada - mas todos os cinco são torcedores.

ON - Qual sua filosofia de vida?
Ancheta -
Uma vida dedicada ao que se faz, a família, ninguém pode me criticar sobre isso, e esperando sempre que felicidade continue nos incentivando para que continuemos até o fim dessa vida. Sempre com seriedade, aconteça o que acontecer, mas acima de tudo respeitando todo mundo. Essa é minha maneira de pensar e vai ser sempre.

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